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Para que não se repita

Uma das frases mais repetidas sobre a tragédia da Boate Kiss é “para que não se repita”. Escuta-se muito que algumas pessoas precisam morrer para que outras vivam melhor. Porém, como estamos vivendo? Com mais qualidade de vida? Com menos ansiedade? Com mais amor ao próximo? Com tolerância e respeito?


Ninguém mais espera o carro da frente nas esquinas. Alguém pára para um carro que está saindo de uma garagem em rua movimentada? Nas faixas de segurança são incontáveis os acidentes, por imprudência de motoristas e também de pedestres. Um país vai ser melhor se o motorista não aguenta andar uma quadra atrás de um carro de autoescola?


Nas empresas, a cada dia, surgem mais colaboradores com problemas emocionais. E não, não são colaboradores tristes, incompetentes. São pessoas alegres, mas que enfrentam a tarefa de conciliar a pressão no ambiente de trabalho, a necessidade de manter uma casa em dia, a importância de pagar as contas básicas, a urgência em encontrar brechas na agenda para o lazer, a pressão por seguir estudando, especialmente dependendo da área em que atua.


O ambiente profissional, apesar de rico em amizades, conquistas, elogios, é perpassado pela competição e falta de empatia. Que país/Estado/cidade são estes que oferecem poucas oportunidades ou espaços debilitados quanto à satisfação cotidiana, mas que, constroem, por meio da sociedade, uma espécie de pódio, em que se enaltece certas profissões, cargos, ocupações? Por que um médico é mais que um pedreiro? Por que uma empresária é mais que uma professora? Quando foi que começamos a medir a história das pessoas com a mesma régua? Ficamos insanos e não percebemos.


Que país é este, em que políticos ganham rios de dinheiro, tem assessores por todo lado, benefícios de toda ordem, fora as parcelas gordas advindas da corrupção, e, o trabalhador, conforma-se com salários atrasados, falta de reconhecimento, estradas precárias e ainda, de dois em dois anos, é obrigado a ver comerciais, gratuitos, no rádio e na televisão para o voto?


Que país é este em que estouram barragens; em que ocorrem incêndios em alojamentos; em que pontes caem? Que país é este, onde se cancelam festas populares com a desculpa de investir em demais áreas? Em que políticos inauguram obras e as pessoas agradecem? Que sociedade machista é esta, que ainda cria desculpas para estuprar ou matar suas mulheres?


Percalços de um mundo contemporâneo de que todos somos parte. Todos! Não só o fulano que votou no beltrano. Não só a fulana que votou nulo. Não só a professora que decidiu fazer greve. Não só o radialista que faz comentários diários nos meios de comunicação. Não só o agente público.


Entraves de um mundo que fala muito e pouco faz. Prega-se empatia, amor, respeito e igualdade nas redes sociais. Na vida real, é isso mesmo que estamos vendo/fazendo?


A ideia é que tragédias não se repitam. Porém, sabemos que é difícil. Estamos sim rodeados por muitas coisas boas, mas, por outro lado, por muitas coisas a serem consertadas e não seria tão difícil assim fazê-las. Mas, talvez, o que mais assuste, é que estamos perdendo o controle. Não aceitamos mais um não; não temos paciência; não nos indignamos com o errado; questionamos o certo; não toleramos; não temos igualdade social; adoramos dizer que não existe preconceito; filtramos mal o que divulgamos; espalhamos fake news; compramos o jornal para ver sangue; não queremos debates e sim ataques; escolhemos inimigos a toda hora; não respeitamos a fragilidade do outro. Quantas tragédias diárias.


A história da KISS está viva. Uma história que começou com luzes, música, alegria e que nunca mais terminou. A noite do 27 de janeiro repousa em nossos pensamentos, que, em dias como hoje, gritam por justiça. Fatalidade? Não. Existem culpados. E não falamos em culpa com ódio, mas sim com um coração perseverante na crença de que um dia todas as pessoas entendam o valor de uma vida, e que, se estiverem responsáveis por outras vidas, cuidem, acolham, preservem.



Foto: agência Brasil- EBC

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